No último fim de semana, o Festival do Meio-outono nos fez relembrar a importância que a lua, símbolo cultural dos mistérios da imortalidade, tem para os asiáticos.
É com frequência que a lua e seu brilho aparecem em canções, poemas, mitos e lendas chinesas como objeto de reverência, já que nela estão guardados os segredos dos seres imortais. Antigamente, acreditava-se que na lua era fabricado o próprio elixir da imortalidade, presente que somente alguns seres humanos já ganharam.
Desde as canções clássicos da era Pré-Qin 先秦时代, até os famosos poemas da Dinastia Tang 唐朝, contadores de histórias brindam à lua para dissolver seus sofrimentos e amarguras.
Su Shi 苏轼 (1037 - 1101), por exemplo, ao olhar para a lua e dizer que “brinda vinho ao vasto céu”, completa dizendo que “gostaria de galopar com o vento” até a lua, porque nela estão os segredos da vida dos imortais.
Na literatura moderna, Lu Xun 鲁迅 (1881 - 1936), em seu livro Ervas Daninhas 野草 também tenta transpor ao leitor a imagem misteriosa que a lua tem:
Outros galhos mais longos, retos e rígidos como metais, permanecem espetando silenciosamente [...] o brilho da lua que enche o céu, tornando-a branca de vergonha. [...] (o céu) parece querer deixar para trás o mundo dos vivos e partir esquivando-se das tamareiras, ficando somente com a lua. A lua, entretanto, também se esconde secretamente a leste.
O mundo dos viventes pode até desejar interagir com a lua e conhecer seus segredos eternos, mas ela mantém sua distância “se escondendo secretamente” toda vez que é “espetada” por nós.
Fica marcado, portanto, no imaginário chinês, que a lua e seus habitantes celestiais interagem com seres humanos somente quando querem, nunca sob demanda humana.
Então, o que fazer para não viver uma vida despercebida pela lua? Enviar Lanternas Celestiais.
Também conhecidas como Lanterna de Kongming 孔明灯 (ou Balão de papel), as Lanternas têm o mesmo poder simbólico que uma oração: enviar para a lua (ou para o Palácio Celestial) uma petição.
O céu imenso, a lua distante e todos os seus habitantes imortais podem até querer distância de nós, mas eles estão sempre nos escutando, atentos.
É por isso que muitas pessoas escrevem o que desejam nessas lanternas e as enviam para o céu, na esperança de que a mensagem seja lida por alguém.
Em alguns lugares da Ásia, casais que querem fazer seus votos de amor também os escrevem em lanternas celestiais e as enviam para o céu, afinal quem melhor para servir de testemunha para um amor que a própria lua?
Há muito tempo, essas lanternas celestiais eram usadas por militares para enviar mensagens para fora do campo de batalha quando encurralados, mas hoje o valor é puramente simbólico. E apesar de grande parte da China não manter a tradição de soltá-las durante o Festival da Lua, no Sul do país e em diferentes países da Ásia o hábito ainda existe.
Mesmo que você não acredite em Palácios Lunares, seres imortais e uma lua que nos ouve, os dias de setembro que marcam o meio-outono trazem essa reflexão: se alguém lá em cima pudesse receber uma lanterna solta por mim, o que eu escreveria nela?
Pensar sobre o conteúdo da mensagem que você enviaria ao céu pode ser um bom exercício para ter clareza sobre o que é que realmente deseja viver na terra.
Mais uma fez, Feliz Meio-outono!